saúde intersetorial
A relação entre os setores de Educação e de Saúde possui muitas afinidades no campo das políticas públicas por serem baseados na universalização de direitos fundamentais e com isso favorecem maior proximidade com os cidadãos nos diferentes cantos do país. Afinidade que, historicamente, já foi unidade, pelo menos no caso do Brasil, quando na década de 50 do século passado que o então Ministério da Educação e Saúde (MES) se desdobrou em dois: no Ministério da Saúde e no Ministério da Educação e Cultura, com autonomia institucional para elaboração e implantação de políticas em suas áreas. Na ocasião, as ações desenvolvidas pelo Departamento Nacional de Saúde, do antigo MES, passaram a ser responsabilidade do Ministério da Saúde.
A partir dos anos 50 até o início dos anos 2000, passando pela redemocratização do Brasil e pela Constituição Federal de 1988, muitas foram as iniciativas e abordagens que pretendiam focalizar o espaço escolar e, em especial, os estudantes, a partir e/ou dentro de uma perspectiva sanitária. Em sua maioria, tais experiências tiveram como centro a transmissão de cuidados de higiene e primeiros socorros, bem como a garantia de assistência médica e/ou odontológica. Assim, centraram-se na apropriação dos corpos dos estudantes, que, sob o paradigma biológico e quaisquer paradigmas, deveriam ser saudáveis.
Noutra frente, a abordagem dos estudantes era realizada sob o marco de uma psicologia “medicalizada”, a qual deveria solucionar os “desvios” e/ou “déficits” ligados ao comportamento/disciplina e/ou a capacidade de aprender e/ou atentar.
Por um ou outro caminho, a saúde entrava na escola para produzir uma maneira de conduzir-se, de “levar a vida”, baseada no ordenamento dos corpos a partir da medicalização biológica e/ou psíquica dos fracassos do processo ensino-aprendizagem. No entanto, esta não era nem é a única opção para trabalhar no encontro da educação com a saúde, ou seja: na implementação de políticas públicas e/ou propostas de ações intersetoriais que articulem as unidades de saúde às unidades escolares. Ao contrário, como reação de educadores e sanitaristas, surgiram outros modos de entender o estreito vínculo entre a produção do conhecimento e um viver saudável, os quais se centram no conceito ampliado de saúde, na integralidade e na produção de cidadania e autonomia.
A publicação da Política Nacional de Promoção da Saúde (PNPS), editada pelo Ministério da Saúde, em 2006, representa um marco político/ideológico importante no processo vivo e cotidiano de construção do Sistema Único de Saúde, uma vez que retoma o debate político sobre as condições necessárias para que sujeitos e comunidades sejam mais saudáveis, propondo que haja uma substituição de um processo de trabalho centrado na culpabilização individual pelo cuidado com a própria saúde.
Assim, a definição de seu objetivo geral de: [...] promover a qualidade de vida e reduzir vulnerabilidade e riscos à saúde relacionados aos seus determinantes e condicionantes – modos de viver, condições de trabalho, habitação, ambiente, educação, lazer, cultura, acesso a bens e serviços essenciais [...] (BRASIL, 2006d) - é acompanhada por um conjunto de conceitos e diretrizes que confirmam uma atitude baseada na cooperação e no respeito às singularidades, como o estímulo à intersetorialidade, o compromisso com a integralidade, o fortalecimento da participação social e o estabelecimento de mecanismos de cogestão do processo de trabalho, que promovam mudanças na cultura organizacional, com vistas à adoção de práticas horizontais de gestão centrando-se na organização do trabalho em equipe.
A escola deve ser entendida como um espaço de relações, um espaço privilegiado para o desenvolvimento crítico e político, contribuindo na construção de valores pessoais, crenças, conceitos e maneiras de conhecer o mundo e interfere diretamente na produção social da saúde.
No contexto situacional do espaço escolar, encontram-se diferentes sujeitos, com histórias e papéis sociais distintos – professores, alunos, merendeiras, porteiros, pais, mães, avós, avôs, voluntários, entre outros –, que produzem modos de refletir e agir sobre si e sobre o mundo e que devem ser compreendidos pelas equipes de Saúde da Família em suas estratégias de cuidado.
Segundo a Lei Básica de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), a educação deve ser inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana e o ensino público deve centrar-se na gestão democrática, cujos princípios são a participação de profissionais da educação na elaboração do projeto político-pedagógico da escola e a participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes. A partir da compreensão de que uma ação intersetorial, uma parceria, existe na medida em que “ambas as partes envolvidas trabalham juntas para atingir um objetivo comum, resultando em benefícios para todos”, (ROCHA, 2008), assim, parece, então, que os sistemas de saúde e de educação no Brasil venceram o primeiro passo para um trabalho conjunto. Ao mesmo tempo, parece que a promoção da saúde apresenta-se como uma forma de pensar e agir em sintonia com este agir educativo, cuja finalidade é a formação de sujeitos e projetos pedagógicos voltados para o direito à vida.
O território é espaço da produção da vida e, portanto, da saúde. Define-se como espaço geográfico, histórico, cultural, social e econômico que é construído coletivamente e de forma dinâmica por uma série de sujeitos e instituições que aí se localizam e circulam. Dessa maneira, o conceito de território é central para se abordar os princípios da Atenção Básica, pois é a abrangência sob responsabilidade da equipe de Saúde da Família para o desenvolvimento de suas ações, onde se vincula à comunidade que aí vive e produz saúde e/ou doenças. É nesse território (que contempla as unidades escolares) e com os sujeitos de sua comunidade onde as equipes de Saúde da Família podem construir e fortalecer a articulação com a comunidade escolar.
Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Saúde na escola / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. – Brasília : Ministério da Saúde, 2009.